Marco Legal das Startups
O Marco Legal das Startups foi um dos grandes avanços da legislação empresarial nos últimos anos.
Em vigor desde 2021, a Lei Complementar de n. 182, traz definições, princípios e diretrizes para o empreendedorismo brasileiro que tanto carece de segurança jurídica para a atração de novos investimentos.
Além de definir o que é uma Startup no âmbito brasileiro, a lei também traz o conceito de investidor-anjo e formas de fomentar o investimento em empresas inovadoras.
Dentre as mais variadas formas de fomento das startups brasileiras, o Marco Legal traz um rol exemplificativo que inclui contratos com opções de compra, sociedades em conta de participação e o popular contrato de mútuo conversível em quotas sociais.
Estes contratos já eram utilizados no mundo dos negócios muito antes do Marco das Startups, mas a definição legal atrai todo o sistema de princípios para auxiliar na interpretação dos contratos, diminuindo a percepção de risco ao avaliar os possíveis conflitos advindos de eventual descumprimento dos acordos.
Isto é, previsibilidade gera mais segurança. Segurança gera mais negócios.
Novo Contrato de Investimento Conversível em Capital Social (CICC)
Interessante o recente movimento legislativo que vem surgindo no Projeto de Lei Complementar (PLP) no 252, de 2023, de autoria do Senador Carlos Portinho, que altera a Lei Complementar (LC) n° 182, de 1° de junho de 2021.
O PLP em questão almeja incluir mais um contrato no rol dos instrumentos legalmente reconhecidos no âmbito do Marco das Startups.
Neste caso, estaríamos falando da instituição de um novo tipo de contrato, que até então lembra muito o contrato de mútuo conversível, mas aparenta ter alguns avanços, tanto em prol dos investidores, quanto também em prol das empresas receptoras do aporte de investimento.
Trata-se do Contrato de Investimento Conversível em Capital Social (CICC).
Um dos problemas detectados na prática de quem vivencia o cotidiano de empresas com contrato de mútuo conversível, é o fato de que, para fins de captação de novos recursos e de novos investidores, há notória característica de dívida.
Assim, poderíamos falar que a Startup é uma devedora em potencial, já que no termo estabelecido pelo contrato de mútuo, o investidor poderá escolher entre receber o valor emprestado (mútuo) ou converter em capital social.
A escolha de receber de volta o valor emprestado implica necessariamente em descapitalização da Startup.
Embora a preferência por este tipo de contrato se revele bem popular no mundo dos negócios (e muito sugerida por nós profissionais da advocacia), devemos admitir que, se a Startup não possuir um bom planejamento estratégico e orçamentário, ela acabará se envolvendo em uma situação de risco operacional.
Sabendo disso, a Startup deve ficar atenta nesta situação para buscar uma nova rodada de investimentos, caso o final seja tendencioso ao resgate do mútuo, ao invés de sua conversão em quotas sociais.
Cabe lembrar também que no contrato de mútuo, qualquer imprevisto ocorrido antes do evento da escolha pelo investidor, pressionaria a Startup a buscar recursos.
A existência de um contrato que a coloca na posição de possível devedora dificulta a tarefa de buscar crédito na praça, razão pela qual o novo Contrato de Investimento Conversível em Capital Social promete mudar esta configuração devedor-credor, característica comum ao Contrato de Mútuo Conversível.
E quanto ao investidor?
Uma das dúvidas que ainda costumam ser debatidas no âmbito dos investimentos de venture capital é a incidência tributária nas operações de mútuo e de conversão do crédito em quotas sociais, sendo debatido, principalmente o Imposto de Operações Financeiras (IOF) e o ganho de capital do Imposto de Renda.
No tocante em específico a este último ponto, caso o PLP n. 252, já aprovado no Senado Federal, fosse aprovado na Câmara dos Deputados e posteriormente sancionado ao final do processo legislativo, os investidores poderiam ter uma maior segurança sobre o tratamento tributário neste tipo de contrato.
Isto porque seria acrescido ao Marco Legal o dispositivo de que “A apuração sobre eventual ganho de capital do investidor em CICC ocorrerá apenas quando da alienação, pelo investidor: I – do CICC, ou II – das ações ou quotas da startup”.
Quando o investidor do contrato de mútuo decide por converter suas quotas, haveria a discussão se a conversão caracterizaria-se em ganho de capital. Isto porque a escrituração contábil pode implicar em um valor maior representativo das quotas do que recebimento do mútuo em si.
O Projeto de Lei Complementar em questão busca postergar esta apuração ao momento em que o investidor efetivamente liquidasse suas quotas, ao invés de pagar pela incidência do ganho de capital no exercício da conversão do investimento.
Ainda que o projeto não tenha sido sancionado neste momento, o Projeto representa uma tímida evolução legislativa em prol das startups e também dos investidores.
Há que se recordar que, com o advento da Lei da Liberdade Econômica em 2019, contratos atípicos podem trazer maior margem de manobra em prol dos legítimos interesses daqueles que desejam prosperar com responsabilidade.
Ou seja, na incerteza do futuro, cabe aos profissionais aplicadores do Direito cultivar a criatividade jurídica para atender aos anseios do mundo dos negócios, e construírem boas alternativas por meio dos princípios e dos mecanismos existentes no direito empresarial
REFERÊNCIAS
LUCAS, Izalci. PARECER Nº 22, DE 2024-PLEN/SF. Senado Federal da República. Brasília: 2024.
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Paulo Veil | Sócio-fundador da RibeiroVeil Advogados. Advogado e professor de Direito. Concede entrevistas espontâneas para mídias especializadas no universo jurídico. Especialista em Direito de Família, Direito das Sucessões e em Direito Empresarial. Palestrante. Escritor. Instagram: http://instagram.com/pauloveil
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